Olodum - Revolta dos Búzios




O panorama político e social do Brasil escravista e colonial foi marcado profundamente por levantes, rebeliões e revoltas da massa escravas e da plebe livre que lutaram de forma o organizada ou não contra o sistema de opressão reinante naquele momento social e político ocorrido no Brasil a pregar a organização de uma República, onde não houvesse desigualdade econômica e social e onde pessoas não fossem julgadas de acordo com cor da sua pele.

A Revolta dos Búzios, Revolta dos Alfaiates ou Revolta das Argolinhas, como ficou conhecido o movimento, recebeu estes nomes devido ao fato dos revoltosos usarem um búzio preso à pulseira para facilitar a identificação entre si, por usarem uma argola na orelha com o mesmo fim e também por que alguns dos conspiradores eram alfaiates. presume-se que os búzios seriam usados como moeda na nova república já que os búzios era moeda correntes em muitos lugares da África Foi formada por pessoas de várias etnias e classes sociais, desde escravos, negros livres, soldados, oficiais militares, sapateiros, carpinas, comerciantes, padres, etc., que aderiram ao Partido da Liberdade.

No dia 12 de agosto de 1798, em dez locais diferentes da cidade do Salvador amanheceram com um manifesto colado em suas paredes, que dizia:

“Está pra chegar o tempo feliz da nossa liberdade; o Tempo em que seremos irmãos: o tempo em que todos seremos iguais”.

“Homens, o tempo da liberdade para nossa ressurreição; sim para ressuscitareis do abismo da escravidão, para levantareis a sagrada Bandeira da Liberdade”.

”Ó vós povos que viveis flagelados com pleno poder do indigno coroado esse mesmo Rei que vós criastes; esse mesmo Rei tirano há que se firmar no trono para vos veixar, para vos roubar e para nos maltratar”.

Estes trechos do manifesto bem demonstram o que combatiam e o que queriam os revoltosos.

No dia 23 de agosto, o autor do manifesto, Luiz Gonzaga das Virgens e Veiga, soldado, negro, foi capturado pelas forças de repressão do governo colonial. Pouco a pouco os revoltosos foram sendo presos, porém todos os intelectuais brancos e detentores do poder econômico foram perdoados; os que foram castigados foram degredados para Fernando de Noronha, ou para a África. Apenas os negros foram severamente punidos, a fim de servir de exemplo para aqueles que teimassem em sonhar com um Brasil livre, democrático e sem preconceitos.


 O que foi a Revolta dos Búzios .

Denominada Conjuração dos Alfaiates”, “Inconfidência Baiana”, “Conspiração dos Búzios”, Primeira Revolução Brasileira, Sedição de Mulatos, o movimento revolucionário de 1798 na cidade do Salvador foi uma das mais importantes manifestações anti - coloniais no Brasil nos finais do século XVII.

Mas sua importância histórica não fica somente no anticolonialismo; e ainda mais singular nos seus aspectos sociais em sua avançada formulação política. Esse movimento se formou sob a influência da filosofia iluminista. Sua concepção política era a República Moderna, regime no qual todos seriam iguais perante a lei e o poder teria sua origem no povo. Eram idéias colocadas em circulação na Europa ao longo do século XVIII, mas que alcançaram a Bahia, via Portugal, com o prestígio das revoluções de 1789 e 1792 na França.

Essas idéias ganharam cor e local na Bahia. Por isso mesmo a concepção de igualdade perante a lei tomou ênfase na igualdade de cor; uma repulsa as discriminações pela cor que então atingiam a Bahia e que não eram agressivas apenas para com os negros. Era bastante mais extensa, por exemplo: com relação aos mulatos (uma categoria que envolvia os pardos e brancos da terra) essa discriminação proibia o acesso aos cargos da administração e a proporção a patente de oficial nas tropas de linha. E somente por causa da cor. Ou porque os mulatos eram a classe de gente a mais orgulhosa e inquieta de todo país, como observou o marechal comandante das tropas pagas em 1803. A idéia de comércio em todos os mares e portos, o movimento de 1794/1798 deu formulação local ao exigir que o porto da cidade do Salvador exercesse o comércio livremente com todos os povos.

OS BOLETINS SEDICIOSOS


O movimento foi publicado na manhã do dia 12 de agosto de 1796 através de 11 boletins sediciosos, papéis manuscritos, com erro de grafia e redação confusa, colocado em pontos centrais da cidade. Desses boletins ainda existem dez no Arquivo do Estado da Bahia, maço 581 da seção Histórica o décimo primeiro foi queimado pelo Coronel Francisco José de Matos Ferreira e Lucena só o conhecemos pelas declarações do seu filho, capitão do Segundo Regimento pago, Antônio José de Matos e Lucena, que assistiu ser deslocado da parede de uma casa e o levou ao pai.

Esses papéis sediciosos, como foram denominados na ocasião, faziam severa denúncia da exploração colonial (latrocínios, furtos com os títulos de impostura, tributos, e direitos que não são elaborados por ordem da Rainha). Expressavam sentimento de independência (seja exterminado para sempre o péssimo jugo reinável da Europa); queriam igualdade de todos perante a lei (ficando cada sujeito as leis do novo código) e formularam promessas de recompensas para os soldados e oficiais dos regimentos pagos (cada soldado receba de soldo dois tostões cada dia, os oficiais terão aumento de posto e soldo).

Ao tomar conhecimento desses boletins, governador da capitania da Bahia, D. Fernando José de Portugal e Castro (1788 - 1801), mandou que o ouvidor- geral do crime, Desembargador Manuel de Magalhães Pinto Avelar de Barbado, procedesse imediata e rigorosa devassa para identificar.


No dia 16 de agosto foi preso o mulato e solicitador da causa Domingos da Silva Lisboa, em casa de quem foram apreendidos papéis que depois se soube que eram os de maior circulação entre os intelectuais e oficiais militares brasileiros (baianos): o Orador dos Estados Gerais as quadras a liberdade e igualdade. Domingos da Silva Lisboa ainda estava preso quando apareceram duas cartas no Convento dos Carmelitas Descalços. Tinham a mesma letra dos boletins. Deduziram logo que isso inocentava Domingos da Silva Lisboa. Foi então o próprio governador examinar requerimentos e petições arquivadas na Secretaria do Governo e encontrou semelhanças (não ficaram provadas) entre as letras dos boletins e a dos requerimentos feitos pelo soldado Luiz Gonzaga das Virgens e Veiga, antigo desertor e conhecido como homem de rezas e orações. D. Fernando ordenou sua prisão. Efetuada, na busca que deram em sua residência encontraram cada manuscrito com o Orador dos Estados Gerais.

A  REUNIÃO DO CAMPO DO DIQUE DO TORORÓ


Após a prisão do soldado Luis Gonzaga, ocorreu uma prisão em casa do ourives, Luis Pires. Estiveram presentes o soldado Lucas Dantas do Amorim Torres, o alfaiate João de Deus Nascimento, o aprendiz de alfaiate Manuel Faustino dos Santos Lira, Nicolau de Andrade, José de Freitas Sacado (Sa Couto).

E decidiram consultar o comerciante - mascate Pedro Leão de Aguiar Pantoja sobre a conveniência de uma reunião no Campo do Dique do Desterro na noite de 25. Não encontraram, que era irmão do Tenente Hermogenes Francisco Pentoja, mas assim mesmo, João de Deus, Lucas Dantas e Santos Lira fizeram convites para a reunião a diversas pessoas. Três dos convidados denunciaram a reunião, foram o cabelereiro Joaquim José de Santa Anna, o ferereiro Ferreiro Joaquim José da Veiga e o soldado Joaquim José Siqueira. Em seguida as denúncias, o governador Coronel Alexandre Theotonio de Souza e determinou ao Desembargador Francisco Sabino Alvares da Costa Pinto que realizasse devassa para descobrir os responsáveis pela pretendida sedição. A reunião do Dique ao compareceram 14 pessoas. Luis Pires, Lucas Dantas e João de Deus esperavam que fossem muitos...

AS DEVASSAS E CONDENAÇÕES

O inquérito do Desembargador Costa Pinto desenvolveu se paralelo ao Desembargador Avelar de Barbelo. E foram realizados dezenas de prisões, dentre as quais as dos Tenentes Hermogenes Francisco de Aguiar Pantoja (5 de janeiro de 1799) e José Gomes de Oliveira Borges (26 de agosto de 1798); do professor de latim Francisco Muniz Barreto de Aragão (20 de dezembro de 1798), do cirurgião e médico Cipriano José Barata de Almeida (19 de setembro de 1798), ao todo 311 escravos, seis soldados da tropa paga, cinco alfaiates, três oficiais militares, dois ourives, um pequeno negociantes, um bordador, um pedreiro, carapina, um professor e um cirurgião tal foi a composição realmente processados.

Em dezembro de 1798 chegou de Lisboa enérgica Ordem Regia. Ordenava imediata conclusão das devassas e severa punição para os culpados. Ainda assim, novamente em sete de novembro de 1799 o tribunal da redação decidiu condenar à morte, pela forca os soldados Luiz Gonzaga das Virgens e Veiga e Lucas Dantas do Amorim Torres alfaiates João de Deus do Nascimento, o aprendiz de alfaiate Manuel Faustino dos Santos Lira e o ourives Luis Pires último fugitivo jamais localizado.


O advogado José Barbosa de Oliveira[1] apresentou sucessivos e inúteis embargos, nos quais analisava as acusações e contestava que houvesse cometido crime de Lesa Majestade. Mas esses soldados e alfaiates tinham sido os escolhidos pelos desembargadores Avelar de Barbosa e Costa Pinto, como responsáveis pela sedição intentada e suas condenações valeriam como terror político para os escravos. Os ex-escravos e os soldados e artesões da cidade de Salvador, ao mesmo tempo desautorizando investigações capazes de revelar pessoas importantes, oficiais militares, intelectuais, comerciantes e proprietários de engenhos, homens bons da cidade do Salvador e Recôncavo (no caso, Santo Amaro, São Francisco do Conde e Cachoeira). Santos Lira, Lucas Dantas, Luís Gonzaga e João de Deus (nesta ordem), foram enforcados e esquartejados no dia 8 de novembro de 1799 na praça da Piedade. Frei José Monte Carmelo, que os acompanhou da capela dos jesuítas até a forca, deixou relato dos últimos dias desses mártires brasileiros.

AS INFLUÊNCIAS IDEOLÓGICA


Existem duas questões a serem considerados nesse movimento de 1794/1798: a influência dos iluministas e pensadores políticos franceses e dos acontecimentos da Revolução Francesa. Foi o professor de gramática latina em Rio das Contas, Francisco Muniz Barreto de Aragão, quem trouxe de Lisboa o Orador dos Estados Gerais em 1792; o Doutor Antonio Alvares de Figueredo lhe emprestou As Ruinas, e um moço pernambucano, chamado José Porphirio lhe deu uma cópia das quadras a igualdade e liberdade. Essas quadras ensinavam:

        Igualdade e liberdade
No sacrifício da razão
Ao lado da sua justiça
Preenchem o meu coração


Esses foram os principais documentos que circulavam na Bahia no período de 1794/1798 quando existiu um grupo, até hoje não de todo identificado, que realizava reuniões fora do centro da cidade e discutia um Governo Democrático para a Bahia. Suas conversas chegaram aos soldados e aos artesões, todos esses homens de cor e filhos de escravos. Borges de Barros (os confederados do partido da liberdade) Afonso Rui (a primeira Revolução Social Brasileira) divulgaram a suposição de uma organização maçônica, denominada cavalheiro da luz, nesse grupo, seriam maçons agrupados pelo Francês Antonio Rene Larcher, capitão da marinha francesa e o comandante do La Preneuse, que esteve na Bahia de Todos os Santos de 30 de novembro de 1792 a 2 de janeiro de 1797.

Mas, a não ser a passagem de Larcher pela cidade do Salvador, nada disso está provado. É somente possível afirmar que a influência ideológica nesse movimento de 1796/1798 a Revolução Francesa, acrescentando se: chegou a Bahia via Lisboa. Mas as Consignas de Liberdade, igualdade e fraternidade; as concepções de Governo Democrático Republicano essas foram adaptadas as condições locais. E é por isso que encontramos nos documentos de 1798 repetidas exigências de igualdade sem distinção de cor.


“A REVOLTA DOS BÚZIOS”


O Grupo Cultural Olodum tem o orgulho de apresentar o 1º documento escrito da saga da liberdade empreendida pelo negro neste país, o texto no verso deste documento foi escrito pelos negros que participaram da Revolução dos Alfaiates, mais conhecida pelo nome de Revolta dos Búzios, de 12 a 25 de agosto de 1798, influenciados pelos ideais da Revolução Francesa, os negros e mestiços de Salvador sonharam em criar uma sociedade, justa, igualitária e com liberdade para todos.

Ousaram escrever um projeto de Brasil diferente deste que hoje vivemos e espalharam um “aviso” pelas ruas da cidade mais precisamente no Centro Histórico, enviaram para o governador geral da época. A tradução para o português atual é a seguinte:

“Aviso ao povo bahianense, que está para chegar o tempo feliz da nossa liberdade, tempo em que todos seremos irmãos, tempo em que todos seremos iguais e fazem parte do partido novo”.

O Grupo Cultural Olodum foi ao Arquivo Público da Bahia e revirou tudo, encontrou as cópias desse documento nos autos de condenação dos que foram enforcados na Praça da Piedade em 1798.



Estamos devolvendo ao povo da Bahia, como presente legado da nossa história, o primeiro planfeto do movimento negro brasileiro, o primeiro texto político-social brasileiro a propor a República como forma de governo, a primeira ação social a questionar os salários diferenciados devido a cor da pele, aos cabelos, a origem racial.

Em 2007 o sonho continua valendo, sendo conduzido pelos descendentes diretos da Revolta dos Búzios, queremos um outro Brasil, sem fome, com casa para morar, com escola digna para todos, com salários dignos, com direitos humanos sendo respeitados, com terras para plantar, venha junte-se aos filhos da liberdade, 209 anos depois o ideal continua....


Olodum, o Bloco comunidade
28 anos de consciência Negra.
Os cavaleiros da luz.
 Os filhos do Sol.
 Os filhos do mar.
Os filhos do fogo.
Os filhos do vento.




Heróis e Heroínas da Revolta dos Búzios

Estes personagens não desfilaram nas páginas da nossa história oficial, mas estão presentes na memória coletiva do seu povo. 


1.  João de Deus do Nascimento, homem pardo, livre, casado, 27 anos, natural da Vila de Cachoeira, cabo de esquadra do segundo regimento de milícia desta praça, alfaiate, preso em 25 de agosto de 1798.

2.  Luís Gonzaga das Virgens, pardo, livre, solteiro, 36 anos, natural da Cidade de Salvador - BA, soldado granadeiro do primeiro regimento da linha desta praça, preso em 24 de agosto de 1798.

3.  Luiza Francisca D’Araújo, parda, livre, casada com João de Deus, presa em 26 de agosto de 1798 e solta em 05 de setembro do mesmo ano.

4.  Lucrécia Maria Quent, criada, forra, natural desta cidade, presa em 15 de setembro de 1798 e solta em 26 de setembro do mesmo ano.

5.  Ana Romana Lopes, parda, forra, natural desta cidade, presa em 15 de setembro de 1798 e solta em 20 de setembro do mesmo ano.

6.  Inácio Pires, pardo, natural desta cidade, preso em 04 de outubro de 1798.

7.  Antônio Simões da Cunha, pardo, livre natural desta Cidade, casado, pedreiro, preso em 10 de setembro de 1798.

8.  Lucas Dantas de Amorim Torres, negro, liberto, solteiro, 24 anos natural desta cidade, soldado do regimento de artilharia e marceneiro.

9.  Manoel Faustino dos Santos Lira, pardo, forro, solteiro, 18 anos, alfaiate e marceneiro, natural de Santos Amaro da Purificação.

Fontes:

Livro O dia em que o povo ganhou
                     
Autor: Joel Rufino dos Santos

Apostila do Olodum 1985 – Curso afro brasileiro do Olodum–

Autor: A.V.S Godi

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